Publicidade e sustentabilidade: caminhos diferentes?
O tema foi uma sugestão da Silvia Schiros, nossa querida colaboradora, ao comentar um post que fiz no meu blog. Vou direto à conclusão. Poupo, assim, o tempo do leitor. Não haverá sustentabilidade enquanto a ideologia publicitária for essa que está aí: consumo acima de tudo.
A razão é simples. Só o “mãozinha”, da Família Adams, é capaz de mexer-se sozinho. As demais precisam de um braço que as faça mexer, inclusive a “mão invisível” do mercado. E de um cérebro que envie comando a este braço. Pois bem, a publicidade é o cérebro que faz mexer esta mão invisível e todas aquelas outras que se mexem avidamente nos supermercados, lojas, etc. Alguma dúvida?
Talvez se possa pensar que o cérebro sejam as organizações produtoras de bens. Vejamos o que nos diz o psiquiatra Cláudio Costa, em um comentário ao post que citei:
“creio que o fundamento da ‘propaganda’ (mantenho o nome) é mesmo a descoberta de que somos “seres de desejo”, e não “seres de necessidade”. Há enorme diferença, tanta que ousaria dizer: o que nos constitue como ‘humanos’ é o Desejo. Animais são seres “de necessidade” e não mais que isso. Ser-desejante nos faz ‘seres-da-falta”: daí, buscamos eternamente algo que nos falta (e jamais saberemos bem o que) e aí, tchan-tchan-tchan!, somos atraídos pelo imaginário, matéria prima do marketing bem feito. Não adianta fazer propaganda: “Coma!”. Comer é uma necessidade, sob pena de morrermos caso não o façamos. Mas comer o que? Aí aparece o desejo: “quero comer tal coisa e não outra coisa”. O cachorrinho não escolhe: estando com fome come qualquer alimento (atraente para sua espécie, claro). Não adianta falar com ele que tal marca de ração é usada por 9 entre 10 estrelas-cadelas, ele traça a que tiver! Eis o preço que pagamos por não sermos cachorro: comemos o mais caro, o desnecessário, o que não precisamos e até o que faz mal.”
Me arrisco numa seara que não é a minha – o entendimento da mente humana -, ao dizer que o papel da publicidade/propaganda (continuarei usando o termo publicidade, mais amplo, visto que propaganda é apenas o produto final) é justamente esse: fazer com que percamos a noção da diferença existente entre desejo e necessidade. E é pelo campo da necessidade que a publicidade ataca. Transformando desejo em necessidade, ela nos faz consumir todo tipo de quinquilharia produzida pelos braços. É o tal consumismo.
Não erro muito ao estimar que 70% de tudo o que é produzido no mundo não é necessário e sequer desejamos. Mas acreditamos que sim, que não mais podemos viver sem as “maravilhas modernas” que nos empurram cotidianamente.
Vamos introduzir a sustentabilidade no assunto. Sustentabilidade é um conceito que busca uma visão sistêmica, holística, da existência humana (e aqui falo de uma visão “sistemica” e não de uma visão “integradora”. Há uma diferença, conforme vamos perceber). Das quatro esferas da existência humana, a sustentabilidade se ocupa de três: a social, a ambiental e a econômica. Deixa de lado, infelizmente, a mais importante, que é a esfera individual. E é nessa esfera, a individual, que a publicidade se faz valer. E é por essa razão que não conseguimos deixar hábitos que são social, ambiental e economicamente nocivos.
Pela influência da publicidade moldamos, ou melhor, determinamos, nosso comportamente econômico, social e ambiental. Nos fazendo acreditar que desejamos mais do que necessitamos, produzimos mais lixo, mais violência, e, por óbvio, mais lucro para os braços que movem a mão invisível.
O interesse da publicidade é o lucro, para si e para os braços (sem dúvida, não há aqui uma generalização. Mesmo porque, as coisas boas também são divulgadas pela publicidade). Mas tudo o que produz lucro, também produz lixo. Esse é o cerne da ideologia: nós (aqui tomados, agora, individual e socialmente falando) e o ambiente ficamos com o lixo; eles com os lucros.
Einstein dizia: “Não dá para resolver um problema com o mesmo raciocínio que o causou“.
A maior parte das soluções apresentadas e/ou em desenvolvimento para resolver o problema do meio ambiente falham exatamente na idéia do Einstein: são soluções ainda no modelo econômico vigente e que, portanto, conitunuarão a exigir uma publicidade dentro da ideologia vigente. É o caso dos chamados biocombustíveis. Trocar petróleo por cana-de-açucar, ou milho, dá na mesma, pois apenas trocaríamos uma Exxon por uma Copersucar (só para citar dois exemplos que vieram imedatamente à cabeça), ou seja, seis por meia dúzia.
E o que faz a publicidade? Não importa se petróleo ou cana, vamos continuar vendendo. Vou apenas trocar o combustível do meu automóvel: gasolina por alcool. Mas não vou andar de transporte coletivo, de bicicleta ou mesmo ir caminhando para o trabalho. Por quê?
(talvez o exemplo mais paradgmático, modernamente, dessa ideologia, seja o celular: pra que trocar de aparelho a toda hora? Por que desejamos mais do que simplesmente conversar, o que, para a publicidade, não passa de uma mera necessidade? Mas necessidade de conversar não vende, né? Pecisamos mais do que isso, afinal? Notícia de hoje nos diz que as trocas superam as vendas de novos aparelhos:
“A indústria brasileira de telefonia móvel vai inaugurar em 2007 um movimento que trará mudanças consideráveis no modelo de negócios de operadoras e fabricantes de aparelhos. Pela primeira vez, o mercado de reposição de celulares superará o de novos usuários… ” sigam lendo)
Só teremos preservação do meio ambinte quando duas coisas ocorrerem:
1. o conceito de sustentabilidade incorporar a dimensão individual, e
2. a publicidade parar de transformar necessidade em desejo.
Ambas de difícil solução. Não que incorporar a individualidade em um conceito seja difícil (a sugestão está dada, afinal), mas porque, para mudar a forma como consumimos o mundo, se faz necessária a segunda.
Publicidade e sustentabilidade: caminhos diferentes? Não necessariamente…
https://www.escosteguy.net/publicidade_e_sustentabilidade/Faça a sua partePara pensarsustentabilidadeO tema foi uma sugestão da Silvia Schiros, nossa querida colaboradora, ao comentar um post que fiz no meu blog. Vou direto à conclusão. Poupo, assim, o tempo do leitor. Não haverá sustentabilidade enquanto a ideologia publicitária for essa que está aí: consumo acima de tudo.A razão é simples....Luiz Afonso Alencastre Escosteguy [email protected]AdministratorEscosteguy
A única solução contra TODOS os males da sociedade global é aGREVE GERAL AO CONSUMO!
Muito bom, Afonso, para fazer pensar mesmo. Caramba.E fico pensando: se para nós, que temos consciência disso, já é difícil mudar, imagina para quem pensa que o que a gente diz é besteira da grossa?Mas eu também acho que essa mentalidade de precisar ter sempre mais não pode continuar, as pessoas precisam se conscientizar de que mudar não só nos ajuda a deixar um mundo melhor para as próximas gerações, mas melhora a nossa qualidade de vida!
Cláudia, E como tu achas que seria posível fazer uma economia crescer infinitamente e o que faz as pessoas (“governo, economistas, empresarios e populacao em geral”, como dizes) pensarem que é assim?É a publicidade, a forma (ideologia) como o mundo é divulgado para nós. Por isso é que somos conseqüência desse modelo. Somos ensinados a pensar assim por todos os lados. Não é pra menos que o famoso ditador alemão tinha na publicidade sua maior arma, pois se as outras matavam os inimigos, a publicidade fez com que milhões de alemães acreditassem nele. bjs
Nao acho q o problema é da publicidade, o problema está no nosso sistema economico q tem q crescer infinitamente e eternamente. Como isso pode ser possivel num país limitado (o territorio do planeta nao cresce) com recursos naturais limitados?Todos os nossos “problemas” como consumismo, aquecimento global, degradacao do meio ambiente vem dessa ideia de crescimento infinito e ilimitado, enqto governo, economistas, empresarios e populacao em geral pensar q tem q ser assim nada vai mudar, somos consequencia desse modelo!
L.Afonso, o dilema está posto: quanto mais consumo (para além das necessidades) tanto mais degradação. A saída, como bem vc. disse, é a “sustentabilidade”. Não atribuo á publicidade toda a culpa, embora seja o grande impulsor do consumismo: descobre desejos inconscientes e promete gozo sem fim, para logo em seguida nos oferecer outro gozo, e mais outro. O “mais gozar” é o objetivo da compulsão, força que se renova tanto mais quanto se realiza: impossível parar. Taí a ausência de ética (lembremo-nos de que ética deriva de éthos = o meio ambiente). Desconsidera-se a necessidade comum e propõe uma solução individualista: eu gozo, o resto que se dane. É preciso uma mundança drástica, que só virá caso comece dentro de cada um de nós, em três momentos lógicos: a) momento de ver, conhecer, tormar consciência; b) momento de julgar, avaliar, medir, escolher conforme o “melhor”; c) momento de fazer, executar, realizar ações que garantam a sobrevivência. Quem sabe a sobrevivência do planeta pode ser uma boa motivação para a publicidade ética?
D. Afonso, é um raciocínio correto, a publicidade que induz ao consumismo é nociva para o meio ambiente. O problema é que fomos programados para consumir mais e mais, sempre aprendemos que comprando favorecemos a economia e criamos empregos e riquezas. O sinal de alarme de que os recursos do planeta estão se esgotando já soou, mas acredito que inverter a mentalidade deve levar ainda algumas gerações. A questão é : será que temos tempo para esperar esta mudança? Um abraço.