O que importa: a função ou o órgão?
“polícia ostensiva e a preservação da ordem pública”.
O órgão:
“às polícias militares cabem…”
É a Constituição Cidadã que assim define: órgão e função.
Por uma questão de formação histórica, somos um povo especialista em lidar com fatos consumados. Não temos a cultura da prevenção. Mas há uma diferença, embora para muitos não perceptível, entre função e órgão. É o caso das polícias militares.
As manifestações populares, que começaram em Porto Alegre, em março, e tomaram conta do Brasil em junho, são a mais clara demonstração do quanto ainda não sabemos diferenciar a função do órgão que a executa. Quiçá movidos por um paralelismo biológico, onde alguns órgãos exercem funções somente a eles cometidas. Daí a confusão de pensar que somente os rins são capazes de “filtrar” o sangue. De há muito sabemos que existem máquinas que realizam a mesma função. E, graças a elas, muita gente sobrevive.
Vivemos, em pleno século XXI, sob a égide do órgão. O órgão é mais importante que a função. Ceteris paribus, o mesmo acontece no quesito segurança pública.
Não importam as razões, mas o fato é que a constituinte de 88 manteve o modelo de privilegiar o órgão em detrimento das funções a serem exercidas. E nisso cometemos o maior erro.
As polícias militares – apesar de acusadas de serem dejetos da ditadura civil-militar de 64 – têm longa história de serem o que são: militares. Militares, por natureza e definição, não são pessoas treinadas para lidar com quaisquer outras situações que não sejam a guerra. Vai daí que a polícia militar, diante de professores, por exemplo, sempre vai agir como se estivesse diante de um exército inimigo a ser derrotado a qualquer custo.
É a definição do órgão. E da definição do órgão deriva todo um adestramento. E aqui surge o coração da questão, quando se fala em acabar com as polícias militares: acabar com o órgão não significa acabar com a função, mas, o que é mais importante, significa acabar com uma natureza de atuação voltada quase que exclusivamente para a guerra. E na guerra a regra é: mate! Antes que te matem.
Essa é a regra nas favelas do Rio de Janeiro e em muitas das grandes cidades brasileiras? Pode ser, mas não é a regra no resto do país. Há momentos de guerra e há momentos de segurança pública. E um órgão adestrado para a guerra jamais saberá diferenciar quando é uma situação ou outra.
Se o coração não bate bem, devemos trocá-lo por outro. Se natural ou artificial, não importa. O que importa é que o novo coração terá novas regras de funcionamento, embora exercendo a mesma função.
A Constituição Cidadã deixou passar batido a questão: manteve a atribuição de funções ao órgão. Mas há de chegar o dia em que saberemos privilegiar a função.
E, nesse dia, entenderemos que sequer de órgãos para executá-la precisaremos…
A imagem reflete bem o que significa ter o órgão como centro de tudo: a cada manifestação dada, o órgão a transforma por uma constante: a imutabilidade do comportamento adestrado: seja um, ou sejam 20 os cidadãos, o órgão há de multiplicá-los por 20 e reagir sem pensar.
Precisamos de uma função que não seja sempre 20… Só com outro paradigma, claro!
https://www.escosteguy.net/o-que-importa-a-funcao-ou-o-orgao/O ChatoA função: 'polícia ostensiva e a preservação da ordem pública'. O órgão: 'às polícias militares cabem...' É a Constituição Cidadã que assim define: órgão e função. Por uma questão de formação histórica, somos um povo especialista em lidar com fatos consumados. Não temos a cultura da prevenção. Mas há uma diferença, embora para muitos...Luiz Afonso Alencastre Escosteguy [email protected]AdministratorEscosteguy