Exatos 40 anos depois…
Em 1976 entrei na Faculdade de Física da UFRGS.
Não demorou uma semana para que uma colega criasse “coragem” para me chamar de rato.
Filho de militar e oriundo do Colégio Militar, naquele mesmo dia quase fui impedido de entrar no “Bar da Química”, que ficava bem em frente da Física.
Fui literalmente vaiado e xingado.
Não fora por minha formação familiar e por toda educação que recebi na escola – que me ensinaram que cabeça nunca se abaixa – teria saído na mesma hora.
Mas não. Permaneci, mesmo que sozinho. Gurizada que eram, não tinham coragem para ações mais violentas do que palavras. Ao longo do semestre reverti a situação, a ponto de a colega ter, um dia, me pedido desculpas.
Há exatos 40 anos vivíamos momentos difíceis no Brasil. Bem piores que esses pelo quais hoje padecemos.
Qual a diferença de lá para cá? Uma única e extremamente importante e a que me fez reverter toda a contrariedade que tiveram comigo:
Éramos, todos, uma juventude consciente e plenamente capaz de fazer suas próprias análises e de chegar a conclusões sem interferências externas.
Entendi e respeitei a razão pela qual haviam me rechaçado como colega. Mas aos poucos pude explicar que ser filho de militar e ter estudado no Colégio Militar não faziam de mim um “espião filhote da ditadura”, um “rato”, como se dizia à época.
Hoje, uma das grandes comunhões entre parcela significativa de adolescentes e adultosé justamente a incapacidade de pensar por si.
No conceito mais moderno de gerações, 40 anos representam duas gerações. Duas gerações (no meu tempo se dizia que uma geração se diferenciava da outra em algo como 30 a 40 anos).
Pois temos duas gerações que não foram ensinadas a pensar. Pior, não apenas não ensinadas a não pensar, mas a beber de fonte única a “realidade”.
Não pensem que seja muito prazeroso assumir que já se é parte da história, mas, próximo de ingressar na fila dos que não precisam pagar passagem de ônibus, sinto falta de pessoas que tenham a capacidade de pensar e de perceber a realidade sem os filtros que a mídia oligárquica neles coloca há mais de 40 anos.
Falta de pessoas que tivessem justas razões para me xingar. E que se permitiam acolher as razões de outros e a mudar as suas.
Havia radicalismo? Havia, mas era um radicalismo instantâneo, não como esse que vemos agora. Hoje, atiçado por setores perdedores, temos um radicalismo que se pode chamar de endêmico.
Não lutávamos apenas para trocar milicos por civis.
Hoje lutam para trocar aqueles que julgam serem corruptos por corruptos piores.
Esse é o tamanho da cegueira atual.
Há 40 anos não éramos cegos…
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