Depois da tempestade não vem a bonança
Não em Porto Alegre.
O que acontece em Porto Alegre (e no Estado) não pode ser imputado ao “exagero” climático ou às tempestades em volumes excessivos.
Pairando apenas em Porto Alegre, a cidade comemorou o funcionamento do muro da Mauá. Nosso atuante prefeito chegou a subir no muro para observar a eficácia da sua decisão de fechar as comportas. lembrando que ele propôs, com o então prefeito, em 2019, que o muro fosse derrubado (aqui e aqui).
E por falar em comportas, não podemos esquecer da comporta que teve seu trilho coberto por asfalto. Além da imensa boçalidade de quem fez isso, a pergunta é: e por onde andava a fiscalização da prefeitura que permitiu que isso fosse feito? E por onde andava a fiscalização da prefeitura que não vistoriava as comportas regularmente? Não podemos acusar o tempo…
O sistema de proteção contra enchentes de Porto Alegre é diabólico: protege as zonas centrais e próximas, mas empurra tudo para as ilhas e os bairros da zona sul. Veja-se o que aconteceu no Lami, Belém Novo, Ipanema e outros. E, pior ainda, com as ilhas. Dezenas, centenas de fotos e vídeos circulam na internet e redes sociais como prova. Não há quem não tenha visto.
Quem sofre? Pergunta retórica, claro!
Temos uma prefeitura – em seus últimos comandos – somente interessada em vender a cidade para os que podem comprar a cidade. O restante da população que se dane. Literalmente. Não há vontade política – e aqui se inclui a maioria dos vereadores que apoiam esse projeto de cidade – para resolver os problemas de moradia das populações dos bairros afastados do centro e, principalmente, os crônicos problemas dos moradores das ilhas.
A proposta de revisão do Plano Diretor de Porto Alegre apresentada recentemente (26/06 – aqui) demonstra claramente o compromisso da prefeitura com “escrever bonito” ou, no popular, “pra inglês ver”. Segundo as palavras do secretário da SMAMUS, “A revisão do Plano Diretor quer direcionar Porto Alegre para o futuro, unindo os anseios da população e a realidade identificada pelos técnicos no criterioso levantamento da Ernst & Young“. Não é o que se vê na realidade de uma cidade que viveu e viverá debaixo d’água.
Ainda, nas palavras do texto da prefeitura: “A proposta de estratégia está dividida em três dimensões: sociedade, infraestrutura e meio ambiente. No caso da sociedade, o objetivo é promover o crescimento da oferta de emprego e a retenção de mão de obra qualificada. Além disso, tratar o patrimônio cultural como uma riqueza social e econômica de Porto Alegre. Na infraestrutura, a ideia é otimizar o uso do que existe e expandir a oferta, com foco nas regiões que não seriam providas de forma independente pelo setor privado. Na mobilidade, reduzir custos e tempo de deslocamento interno e potencializar a integração de Porto Alegre com a Região Metropolitana. Na dimensão meio ambiente, o objetivo é desenvolver uma cidade que seja ambientalmente consciente, equilibrando o desenvolvimento urbano com a preservação da natureza e a proteção dos recursos naturais“.
“tratar o patrimônio cultural como uma riqueza social e econômica” significa conceder nosso patrimônio para a exploração da iniciativa privada (veja-se, a exemplo, a concessão dos parques e da orla); “uma cidade que seja ambientalmente consciente, equilibrando o desenvolvimento urbano com a preservação da natureza e a proteção dos recursos naturais” é, de longe, o que mais tem sido descumprido. Antes, já estão destruindo a natureza de Porto Alegre (veja-se, a exemplo, a Estância da Harmonia e a absurda quantidade de árvores derrubadas) para que sobre apenas o “desenvolvimento urbano”, ao gosto dos compradores.
Não teremos bonança enquanto prevalecer esse tipo de projeto para a cidade.
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